sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Paralisação administrativa pode interferir na política externa dos Estados Unidos




(Fotos: Reuters)
Saia justa – Em uma das fotos oficiais da conferência de cúpula do bloco Cooperação Econômica da Ásia e do Pacífico (Apec), na Indonésia, pode-se ver na segunda fila a figura um tanto deslocada de John Kerry. Enquanto os presidentes da China e da Rússia foram, de forma quase natural, colocados no centro da primeira fila, o secretário de Estado norte-americano teve que se contentar com um papel secundário, ditado até mesmo pelo protocolo da reunião.
Afinal, Kerry era apenas a segunda opção, uma vez que o presidente Barack Obama teve que cancelar de última hora sua viagem à Ásia, para lidar com a crise gerada pela paralisação de seu governo.
O envio do secretário de Estado no lugar do presidente foi um claro sinal de que, desde 1º de outubro, Washington está longe do “business as usual”. Tal se deve ao congelamento de grande parte do aparato administrativo nacional, em decorrência do assim chamado shutdown. E, no entanto, os efeitos para a política externa e de segurança dos Estados Unidos são modestos.
Consequências simbólicas
O primeiro-ministro da Malásia, Najib Razak, comentou que, ao não comparecer à reunião da APEC, Obama perdeu uma ótima oportunidade para reforçar suas intenções de liderança na região. Mas a ausência do presidente acabou não tendo consequências de fato – a não ser nas fotos oficiais –, já que a cúpula não trouxe qualquer resultado concreto.
Matthew Baum, professor de Comunicações Globais e Políticas Públicas da Universidade de Harvard, confirma que “as consequências serão mais simbólicas do que práticas”. “É como se os Estados Unidos não conseguissem manter a própria casa em ordem, resultando na impressão de que o país não está apto a honrar suas responsabilidades como líder mundial.”
Essa impressão é reforçada por dois outros efeitos visíveis da paralisação na política externa e de segurança dos EUA: os cancelamentos da próxima rodada de negociações da Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP, na sigla em inglês) e da planejada manobra militar com o Japão.
Mas, também nesses casos, o efeito simbólico é maior do que o real. As negociações da TTIP foram apenas postergadas, não canceladas. Quanto ao exercício militar nipo-americano, com apenas mil soldados tratava-se, antes, de um pequeno evento, não de uma grande manobra. Missões e gastos importantes de defesa – por exemplo, no Afeganistão – estão, de qualquer modo, a salvo do bloqueio orçamentário, graças a uma cláusula especial.
Ajuda humanitária e militar continua
“A política externa americana segue adiante”, ressalta Baum. “As embaixadas não estão fechadas e os consulados seguem funcionando. Mas, claro, sentem-se efeitos. Podem, por exemplo, acontecer atrasos no processamento de passaportes ou de pedidos de imigração para os Estados Unidos.”
Da mesma forma, a ajuda humanitária e militar dos EUA permaneceram quase inabaladas, até o momento. Apesar do shutdown, a agência de desenvolvimento internacional Usaid continuará a arcar com a maior parte dos custos de seus programas de ajuda. Como o financiamento da maioria desses programas se estende por vários anos, a paralisação ainda não os afeta, explica o jornal “The New York Times”. Os programas de desenvolvimento só serão atingidos se a crise orçamentária se prolongar.
O mesmo se aplica à ajuda militar americana. No orçamento de 2014 estão previstos 3,1 bilhões de dólares para Israel e 1,3 bilhão de dólares para o Egito. Caso a paralisação venha a se estender, esses pagamentos não poderão ser efetuados. Porém no caso do Egito, a crise atual não é o fator determinante para a eventual continuação da ajuda militar de Washington. No ano orçamentário anterior, os valores não foram transferidos em sua totalidade devido à instabilidade política do país. No geral, o apoio financeiro aos egípcios está sob observação, desde o golpe militar contra o presidente Mohammed Morsi.
17 de outubro: o Dia D
O congresso americano tem até 17 de outubro para chegar a um consenso sobre o necessário aumento no teto da dívida americana. Comparado às consequências de um fracasso nessas negociações, os efeitos da crise orçamentária parecem praticamente irrelevantes.
Segundo Heinz Gärtner, especialista em Estados Unidos do Instituto Austríaco de Política Internacional, “as consequências serão dramáticas”. “Pois aí, o Estado não poderá mais fazer empréstimos, e isso afetará as políticas de sanções, externa e de segurança, assim como o acordo de livre comércio”, explicou.
Caso no dia 17 de outubro o governo americano venha mesmo a se afundar numa dupla crise de orçamento e de gastos, as consequências seriam incalculáveis, não só para os Estados Unidos, como para o mundo. Se as piores previsões se confirmarem, os efeitos serão extremos para a política externa e interna de Washington, e um fracasso das negociações sobre o teto da dívida provocaria o colapso da economia americana e mundial, adverte o professor Baum. “Entretanto, no momento tudo não passa de especulações, pois algo assim nunca aconteceu, até hoje”, relativiza. (DW)
  

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